sábado, 20 de março de 2010

A Guerreira - II


Dirigindo...


Nesse mesmo mês de abril, o marido de Lívia , faleceu
num hospital judiciário a 150 km de sua cidade, completamente só,
sem a presença de um filho sequer, dentre os doze que restaram-lhe.
Walter, o quinto dos seus filhos foi o encarregado de ir até a capital
para providenciar o enterro por lá mesmo. Transladar o corpo sairía caro
demais, e além de não terem o dinheiro, o defunto não merecia tanto es-
forço assim. Jorge foi enterrado em cova rasa por lá mesmo.
Walter divagou então no passado, enquanto o corpo de seu pai era enterra-
do...se viu menino comportado (era um dos mais tranquilos da prole), obser-
vando os irmãos atentados que aprontavam todas de uma vez só. Reviu peripé-
cias que no fundo o encantavam, mas que ele nunca havia se permitido parti-
cipar. Lembrou do dia em que seu pai chegou do serviço procurando por seus
irmãos Lúcio e Laura. O pai trabalhava numa usina de aço, e fazia turnos de
oito horas alternados, naquele dia ele estava de 08:00 às 16:00. Ele tinha
cinco carros na garagem, e Lúcio, mais velho que Laura quatro anos, havia
feito cópias das chaves dos carros do pai, ele ensinou Laura a dirigir, e
assim que o pai saía, os dois escolhiam os carros e saíam pelo bairro tiran-
do onda. Só que naquele dia, o pai os viu de dentro do pátio da usina,
os dois ingênuos acharam de passear na transportadora da usina. Batata!
Jorge chegou irado e gritando:-Lívia! Quero o Lúcio e a Laura aqui agora!
Mamãe sabia que haviam aprontado...tentou amenizar a situação,
mas ele não permitiu: -Afaste-se daqui, meu negócio é com os dois,
saía! Lúcio tremia muito, sabia que o coro iría comer solto. Laura, até sentia
medo, mas o topete a impedia demonstrar isso.
Claro que seu pai voltou sua ira todinha para ela: -Você é bem atrevida
mocinha! O que tem para falar em sua defesa? Ela tinha apenas 9 anos na época,
mas o topete era de quem tinha 30: -Eu queria aprender a dirigir e meu irmão
me ensinou! - Hum..,e você aprendeu? - Dirijo bem para a minha idade! - Quero
ver isso de perto, vem comigo os dois! Ele escolheu o Volkswagen (ainda não
era fusca, rs)1963 e os levou para um bairro distante do que moravam.
Quando chegaram em uma estrada empoeirada, sem asfalto e reta, desligou o
carro e passou para o banco do carona:
-Agora assuma a direção Laura! Ela exultou! Não pensou duas
vezes e assumiu tranquilamente a direção.Era uma reta, e fazia um sol
escaldante.Como queria mostrar serviço,achou por bem correr um pouco,
a poeira logo tomou de assalto quem estava atrás deles.
Devia estar a uns 60km por hora,
e isso numa estrada sem asfalto e a direção nos mãos de uma criança,
é como estar na fórmula 1.
Seu pai olhava meio que surpreso e orgulhoso da filha, mas não dizia
nada. Derrepente surgiu uma curva, e ele falou: -Entre alí! Ela disse: -Pai,
estou correndo, não dá para entrar alí! -Entre alí, eu mandei! -Bom,
o carro é seu mesmo! Virou o volante imenso com todas as suas forças de
uma vez só! O carro cantou pneus e foi parar no balcão de um bar que havia
na esquina
da rua. Graças a Deus o bar estava vazio, e o balcão era de alvenaria...
o resultado disso tudo foi o prejuízo que seu pai teve com o bar e com o
carro batido e amassado. Foram para casa e ele surpreendentemente disse a
Lívia: -Mulher, essa menina é minha filha mesmo! Louca tanto quanto o pai!
Não apanhou naquele dia, mas agora sim, tremia feito um pudim...
Walter se lembrou de quantas vezes Laura contou essa história para
ele e
deixou uma lágrima rolar de encontro a cova do pai enterrado. Virou as
costas e retornou a sua cidade. A mãe, Lívia o aguardava sem saber que
estava viúva...

(Nane-20/03/2010)
Continua...

Um comentário:

  1. As historias que nos constituem e nos formam tornado-nos o que somos...Beijo
    Tô gostando de ssa "nova fase"...

    ResponderExcluir