terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Pelas ruas

O último copo de cerveja
Borbulha em minha frente
É madrugada
Os bares fechando
Me pedem delicadamente
Para que me retire
Sem mais nada pedir
Saio a contra gosto
Desejando mais uma
Ouvir mais uma nota
De um cavaquinho qualquer
Ou quem sabe de um surdo
Lamentando a partida
De um enredo perdido
No lumiar da esquina
A lâmpada piscando tosca
Talvez sejam meus olhos
Inundados de cerveja
Na madrugada aflita
Lacrimejando saudades
De um tempo ido
Em que eu era eu

(Nane - 31/12/2013)

Um instante só

Essa fissura me consome
Cobrando seu carinho
Um olhar
Um afago
Coisas que naturalmente
Outros tem de você
E eu...espero em vão

Sinto o seu carinho
E a sua mão pesada
Que me acusa de coisas
Que nem sempre eu fiz
E me calo cabisbaixo
Para não te perder
Sabendo que nunca te tive

Embaralham as entrelinhas
Quando tento rabiscar
Esse desespero que dá
Cada vez que seu chicote
Estala no ar
Pronto a proibir
O meu direito de te olhar

Pedir ou implorar
Pouca valia tem
Teu sangue quente transborda
E cozinha o meu querer
Sempre pronto a implorar
Por um só instante do seu olhar

(Nane - 31/12/2013)




segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Galinheiro

Pouco há o que fazer
No chão estorricado
Espero passar a lua
Para recomeçar

Agora o que me encanta
Se atém a um cercado
Onde o cacarejar do galo
Anuncia a alvorada

Levantar cedinho
Distribuir o milho
Oferecer a água fresca
E os ovos recolher

As pequenas codorninhas
Generosas como o que
Bagunceiras também
Precisam de pouco espaço

Vou plantando aos poucos
E criando o galináceo
Há o tempo de plantar
E o tempo de cuidar

(Nane - 30/12/2013)

Tempo quente

O mato floresceu
Posto que também é vida
Na horta subjugada
Aos despautérios do tempo

É hora do descanso
Da terra batida
Por tantos frutos
Oferecidos

O sol forte do verão
Misturado aos temporais
Cansa o generoso torrão
Que se abriga sob o mato

Eu insisto em arar
Muitas coisas não dá mais para plantar
É preciso saber das safras
Que hão de germinar

Enquanto a horta se prepara
As árvores dão seus frutos
Acerola, maracujá e manga
Tangerina, goiaba e limão

O mato tomou conta
Mas só por enquanto
Logo estará domado
E a horta renovada

(Nane- 30/12/2013)



domingo, 29 de dezembro de 2013

Vício

Sem noção nenhuma
Sou eu
Que me perco em palavras
E na vida

Amotinado em meu peito
Adormece
Sob o efeito narcótico
Do álcool

Todo o sentimento sentido
Camuflado
No sorriso tosco que insisto
Em sorrir

No final, sem pedir
Uma lágrima
Esquenta a face
E cai

Noção nenhuma
Tantas tentativas
Recomeço sem futuro
Vício puro

(Nane - 29/12/2013)

sábado, 28 de dezembro de 2013

Navegando

Da janela do quarto 
Em meio a penumbra
Observo lá, distante
A luz fosca
Piscando incansável
Feito farol no mar

Navego em meus alheios
Deixando os pensamentos
Ao sabor das ondas
Que na minha maré
Sob a penumbra silenciosa
Tenta se tranquilizar

(Nane - 28/12/2013)

Podridão

Dou minha cara para bater
Sem me importar
Com o que vão dizer
Ou pensar

Falo tudo o que penso
Escuto o que não quero
Sou besta repreendida
Repreendendo a besta alheia

Meus olhos pouco veem
Além do que querem ver
Rezo meu terço sem esquecer
Do umbigo na minha barriga

Rezo à Santa julgada pecadora
Por mim e por quem mais vier
Não sou santa e nem herege
Só alguém sem paz

Dou minha cara a tapa
E mando à merda os demais
Que fingem ser o que não são
Camuflados em podridão

(Nane - 28/12/2013)






Desdenhando

Não delimito meus sonhos
Aos passos que posso dar
Sempre vou além do que minhas pernas
Conseguem traçar
E por vezes isso me custa caro
Mas insisto em viajar
Nos sonhos dos quais não consigo acordar

Os que convivem comigo
Me acham (mas não falam) insana
Olham-me atravessados
Como se eu fosse- num surto qualquer- lhes atacar
Então fingem me aceitar
E eu insisto em viajar
No meu altismo deliberado

Por vezes a solidão
Consome todo o meu humor
E extravaso sem censura
Nos versos que insisto em rabiscar
Feito poeta fingidor
Que não percebe a própria dor
Quando escreve alcoolizado

Meus sonhos povoam minha imaginação
E são tão e só meus
Que mais ninguém consegue entender
Quando num sorriso sem rir
Eu desdenho de mim mesma
Por saber que sonho em vão
Com as viagens que nunca irei fazer

(Nane - 28/12/2013)

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Harehama

Então é Natal
Quando os ricos comem
E bebem também
E os pobres se endividam
Para aos filhos presentear

Então é Natal
A festa cristã
Onde o novo faz escárnio
Do velho que sobrevive
Até seu último dia

Então é Natal
Pro enfermo do SUS
Na maca exposto
Enquanto o rico
Transplanta seu mal
Sem entrar na fila

Então bom Natal
E um ano novo também
Que seja feliz
Quem puder comprar seu bem
De tantos valores
No bolso e no banco

Harehama
Fiz o que pude
Hare se não paguei
Hama não pude
Harehama
Viva o recomeço

(Nane - 27/12/2013)



quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Maquininhas

Sombras na multidão
Silenciosa
Que segue em frente
Robotizada
Olhando suas maquininhas
Conversando com fantasmas
Gente de tão longe
Sem mais precisar
Do calor do abraço
Do olho no olho
Gente esquecendo
O sabor do beijo
O gosto da lágrima
Compartilhada
Na dor ou na alegria
E mesmo dentro de casa
As maquininhas são prioridades
Fala a mãe com o filho
O pai com o tio
Sem se recordarem
Do timbre de uma voz
Até o assaltante
Agora se informatizou
Já não porta um revólver
Rouba com o mouse
Ou com o WhatsApp
Sombras na multidão
Silenciosa e solitária
Que segue em frente

(Nane - 26/12/2013)

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Festas

Repenso meus sentidos
Sentidos em meu sensor
Que alcoolizado
Presente a acepção
Da falta de sentido

Um grito lancinante
Emudece a garganta
Um pedido de socorro
Que mais ninguém escuta
O Natal se aproxima

É farta a barba branca
É falta de quem fui
Na mesa a rabanada
Adocica as bocas
E os abraços de confraternização

É preciso me conter
O Natal diz tanto...
A noite do ano bom já vai chegar
E aí sim, vou me acabar
Deixando sem sentidos
Todos os meus sentidos

(Nane - 18/12/2013)

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

NENSE

Lá no fim do arco íris
Havia um pote
Mas ninguém o alcançava
E choravam o ouro perdido

O arco íris colorido
Tantas cores e tanto ouro
Neguim trepando um em cima do outro
Mas ninguém o alcançou

Então veio o velho feiticeiro
Surgido lá do além
Sentado num tapetão luzido
Vindo das mil e uma noites

Mago de toda a safadeza
Poeta da dramaturgia
Anunciando o chororô
Do arco íris desvirginado

Um só time Tricolor
Tomou de assalto o pote de ouro
Agora tremem as outras cores
Do mal fadado arco íris

Falem bem ou falem mal
O importante é ser feliz
Divisão por divisão
Sou Tricolor de coração

(Nane - 17/12/2013)





domingo, 15 de dezembro de 2013

Meu neto, meu filho e minha mãe


Vértice de nós
Em noite de Natal
Começo, meio e fim
Da pirâmide familiar

O neto
O filho
A mãe
Quatro gerações

Unidos na mesma ceia
Tão santa quanto a outra
Agregados num mesmo enredo
Festejando a união

Juntos abençoados
Ao badalar dos sinos
Que anunciam o nascimento
Do menino Deus

Vertentes criadas
Rumos traçados
Estradas paralelas
Se unindo nessa noite

Abraços e beijos
Promessas e desejos
Noite feliz
É Natal

(Nane - 15/12/2013)


Aninhando

Hoje sou passarinho
Sobrevoando ao teu redor
Ao sabor do verão
Que me tráz até você

Canto meu canto de migração
No entorno do teu coração
Enquanto alada busco
Pousar no teu abraço

Beijar o teu sorriso
Ao afagar os teus cabelos
Quando em revoada
À ti eu retornar

Abraça minhas asas
Aninha-te em meu colo
Voa comigo sem pressa
Pelos ares da imaginação

Quando pousarmos na realidade
Adormeça em meu regaço
E deixa que os teus sonhos
Eu embala nos meus braços

(Nane - 15/12/2013)




sábado, 14 de dezembro de 2013

Voando sem rota

São tantas as faltas que sinto
Que me perco sem saber
Em que direção vou seguir
Nesse voo destrambelhado
Rumo a lugar nenhum

Norte, sul, leste ou oeste
Bato as asas à deriva
Mergulho num rasante
De um mar nebuloso
E revolto

Você partiu
Não deixou o endereço
Meu rumo se perdeu
Sem o código postal
De onde chegar

Gaivota solitária
Rumo a um horizonte
Inatingível
Em vertical
Dopada

Mas de todas as faltas
A que mais me faz
Aporta num porto
Que se não seguro
É só onde eu quero...pousar

(Nane - 14/12/2013)

Pé de serra

Dane-se o mundo
Que não vive em mim
Embora me cobre
O tempo inteiro
A vida em mim

Danem-se as pessoas
Que se escandalizam
Com o meu jeito de ser
Ou de dizer - o que penso
Sem meias palavras

Louca ou insana
Dou minha cara à tapa
Refletida nas palavras
Que jorram de mim
Em linhas tortas

Sou cristalina
Feito água de rio
No pé de serra
Nascente em fio
Transbordando em curvas

E morro sem força
Quando imolada
Em plena cidade
Por detritos expostos
Nas valas da vida

(Nane - 14/12/2013)



sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Reflexão

Reflito
Refletida
No espelho 
Embaçado
Pela fumaça
Do cigarro
Enquanto
O tempo
Passa
E leva
Embora
O reflexo
Do que fui
Sem a fumaça
Embaçando
O espelho

(Nane - 13/12/2013)

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Sem mais

O quê desejar a essa altura da vida
Se de tudo tive um pouco
E ainda que só nos sonhos
Fui além do que podia - e devia

Fiz da vida poesia
Por vezes triste
Por outras de euforia
Quimeras e magia

Atravessei mares
Voei por continentes
Me fiz presente
Por onde nunca estive

E tive em minhas mãos
O que nunca pude tocar
Errei e acertei
Amei e fui amada

Ainda sonho sim
Ainda tenho expectativas
Que se não se realizaram
De alguma forma as vivi

Tenho sim uma melancolia
Que me inspira e serve de combustível
Para esse monte de "abobrinhas"
Que insisto em "rabiscar"

Mas sei que disso tudo
Algo se aproveita
Rabisquei amor, dor e flor
Cão vadio, homem e mulher

Estive em cada palavra
Cada frase, vírgula e reticência
Por onde andei eu escrevi
Quem leu e não entendeu...me perdeu
De vista

(Nane - 10/12/2013)

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Estações

Hoje as minhas flores
Se abriram e sorriram
Como a me lembrar
Que ainda é primavera
Em pleno verão

A orquídea rainha
Abriu temporã
Sem se importar com o tempo
Nem com o vento
Floriu tão linda

Em vários ângulos
Se deixou fotografar
Posando para a vida
Fazendo do verão
a sua estação

Primavera passando
As flores se despedindo
As praias se enchendo
O mar se agitando
E a orquídea se abrindo

Não faz sentido
Mas é a falta de sentido
Que faz a beleza existir
Na insana loucura
De um grande amor

(Nane - 09/12/2013)

domingo, 8 de dezembro de 2013

Odoyá

Mãe de todos
Rainha do mar
Não julga seus filhos
Ama por amar

Morena faceira
Dos negros cabelos
Me farto em teus seios
Do alimento vital

Deusa da compaixão
Senhora divina
Odoyá Afrodite
Beleza suprema

Generosa senhora
Compadece de mim
Abençoa a rota
Não me deixe à deriva

Toma nas tuas
As minhas mãos
Mãe abençoada
Sou filha tua

A minha tristeza
Afoga no mar
Odoyá Iemanjá
Me livre de chorar

Mãe de todos
Rainha do mar
Morena das águas
Odoyá Iemanjá

(Nane - 08/12/2013)

Desatando nós

Feliz por ti
Feliz por mim
Feliz por nós
Desatando nós

No peito uma incerteza
Meio que tristeza
Por saber que o tempo
Nos marcou e nos mudou

Mas é tão bom
Que mesmo assim vale a pena
Te perder de vista
Faz mal pra minha vida

Com a ansiedade da criança
Em noite de Natal
Aguardei tua presença
E vibrei com tua chegada

Não saia mais de mim
Fica aqui
Sou tua morada
És minha alvorada

Feliz por ti
Feliz por mim
Feliz por nós
Desatando nós

(Nane - 08/12/2013)








sábado, 7 de dezembro de 2013

Mais uma

Desce gelada a cerveja
Refrescando a garganta
Entorpecendo a cabeça
Ditando as palavras

Houve um tempo em que eu bebia
Com os amigos que eu tinha
E virava a noite
Na boemia

Hoje a cerveja
Loira e gelada
É a única companhia
Nas minhas noites vazias

Dos amigos abri mão
Das noitadas
Troquei o lugar
Mas da cerveja...essa vai comigo

Desce gelada a cerveja
Refrescando a garganta
Entorpecendo a cabeça
E ditando as palavras...

(Nane - 07/12/2013)


...- Feiras

Se odeias a rotina
De toda a semana
Levantar e sair para trabalhar
E encarar o trânsito
Seu chefe mal humorado
Os dias inteiros iguais
As noites menos tensas
Ainda assim iguais
Segunda
Terça
Quarta
Quinta
Sexta
São todos feiras
Te resta o frisson
Da chegada tão aguardada
Do final de semana
Que passa voando
Sem que o vejas

Se odeias essa rotina
Não conheces a minha
De caminhar do quarto
Até a sala
Ou ao banheiro
Com tanta dificuldade
E a ajuda forçada
De quem um dia
Eu pus no mundo
E hoje me serve
De bengala ambulante

Mas hoje é sábado
Não tem a feira
A tua rotina
Até amanhã
É divertida
Então aproveita
Enquanto podes
Pois as feiras
Logo virão
Com o tédio que sentes
Na rotina maldita
Que tanto odeias
Enquanto a minha
São sempre feiras

(Nane - 07/12/2013)


Ponto de vista

Deus e o diabo na terra
Quem é quem
O bem e o mal
Um ponto de vista
Da verdade e da mentira
Ilusão e realidade
Tristeza e felicidade

Orgulho ferido
Castigo sentido
Não faz sentido
Sorriso aberto
Música no ar
O que importa
É a vontade que dá

O que foi, passou
Recomeçar
Sentir o sentido
Do sangue pulsar
Num simples piscar
Mandar tudo a merda
Sorrir sem parar

Augusto sorriso
Altivo e escrachado
De tolo apaixonado
Dos anjos flechado
Vendo poesia
No sol escaldante
Do oásis desértico

Então que assim seja
Promessa feita
De um recomeço
Sem o fantasma de Otelo
O bem é o bem
Não importa mais ninguém
Desdêmona é eterna

(Nane - 07/12/2013)



quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

O sonho de Ogum

Ogum sonhou
Com a filha de Nanã
Sem saber que seu encanto
Era o fio da navalha
Forjado na própria espada
Que deu a ela

Iansã feriu seus brios
De guerreiro lutador
Quando se tornou rainha
Da corôa de Xangô

Ogum guerreiro
Se deixou levar
Pelos olhos feiticeiros
Que julgava serem estrelas
E no mar os foi buscar

Ogum sonhou
E se desencantou
Iansã, tão bela
O desdenhou
Fazendo nascer a ira
Do guerreiro lutador
Que perdeu seu grande amor
Para o deus que era de paz


(Nane - 05/12/2013)



Sodoma & Gomorra

Em torno
Revisto
Um dia a mais
Talvez um de menos
Ou nem mais dias hajam
São segundos e horas
Que se arrastam e seguem
Enquanto vida há
No pulso que pulsa

Lá fora cai uma tormenta
Gotas ácidas que perfuram
A superfície em que tocam
Deixando cicatrizes profundas
Feito lavas de um vulcão
Petrificando tudo o que tocam
Transformando em gelo o calor
De quem um dia amou

Nada mais resta a fazer
Ou mesmo a lamentar
Nem Sodoma e nem Gomorra
Apenas cinzas restaram
Sem sal ou sem açúcar
A estátua era de areia
Que na maré se desmanchou
E nunca mais...voltou

(Nane - 05/12/2013)


quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Carnaval - ilusão sabida

Ah...esse vento frio que sopra
Levando embora meus sonhos
Deixando arrepios de incertezas
Onde antes haviam desejos

Calafrios sinistros restaram
Da ansiedade que outrora vibrava
Pelo dia vindouro de surpresas
Feito presente a ser desembrulhado

Já não há mais perspectiva
Do sorriso e da alegria
De presentes ou de poesias
Nem mesmo de um novo dia

O calafrio domina
O vento sopra estridente
A noite nunca acaba
A vida não passa

O Natal se aproxima
Sem presente e sem pacote
Sem fita e sem laço
Só um vento gelado

Papai Noel não existe
Meus sonhos também não
São meras ilusões
Prefiro o carnaval

(Nane - 04/12/2013)

Ao sabor do vento


Velejo por todos os mares
À deriva,
Buscando em cada porto, a segurança
Inexistente
Na rota definida...
Afogo,
Nessas águas turbulentas,
Toda e qualquer reticência
Da esperança em calmaria...

Na verdade busco sua presença

Em cada porto que sei, não é seguro.
E me deixo levar pela maré
Sem ter forças para remar,
Na direção que ela quiser me levar...
Navego,
Num veleiro predestinado,
De bandeira com sua face
Hasteada e altiva
Tremulando ao sabor do vento.

(Nane - 04/12/2013)


Seu codinome

A bela senhora
Sedutora e misteriosa
Abraçou todo o corpo
Se apossou
Não tem mais espaço
É inteiro dela
Que se glorifica
E toma de assalto
Sem nenhuma brecha
Para mais nada
A bela senhora
Dona de tudo
Já não se preocupa
Se a morte virá
Por sua culpa
Importa é dominar
A mente demente
Que fragiliza o corpo
Ao se entregar
À Dama de codinome
Tristeza

(Nane - 04/12/2013)


Choro livre

A noite está quente
Escura
Convidando ao acaso
De passos na rua
Onde lágrimas livres
Rolam sem vergonha
No rosto de olhos vermelhos

Essa dor incauta
Já tomou conta do ser
Que de tanto ser forte
Tornou-se fraco
E desaba na noite
Em rios de lágrimas
Por hora  - na escuridão - livres

Vão-se as luzes
Do dia denso
Trocado por refletores
Da noite generosa
Que acolhe as lágrimas
Sem perguntas indiscretas
Num silêncio gritante

Torrentes
Inundam
Feito rio
Transbordante
Nas cheias
Do verão
Os olhos vermelhos

(Nane - 04/12/2013)

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Incondicionalmente Tricolor


Honra-me com tuas cores
Que impregna-me a alma
Orgulhosa e apaixonada
E por ti, eternamente encantada

Chora essa alma desencantada
Com os homens que te estão (mas não são)
E fecha contigo o pacto eterno
De mais do que estar, eternamente ser

Deixa que o escárnio se faça
Mi'alma chora, não por ti
Que se fez fruto desse amor incondicional
Seja onde e como for

Chora pela incompetência
De quem não soube te representar
Com toda a grandeza que tuas cores
Traduzem 

Chora sim mi'alma
Mas ama com maior intensidade
Posto que sabe da precisão
Do amor por ti dedicado

E donde quer que tu vaias
Contigo hei de estar
E mostrar ao mundo orgulhosa
Teu escudo tatuado em minha pele - corpo - casa de mi'alma
Que hoje chora...

(Nane - 02/12/2013)

Platão

Amor platônico
Sem direito ao toque
Ou ao olhar nos olhos
Sem cheiro nenhum

Ainda assim amor
Dizimando a realidade
Fervendo a imaginação
Doendo feito dor real

Infeliz do amor
Que nunca viu ou sentiu
O calor e o suor
Do outro a que se quis

Amor tão intenso
Que de tão real
É incompreensível
Para quem nunca o teve

Amor que se faz eterno
Vivendo na sombra
Da vida passada a limpo
Rascunho da morte

Na teoria da morte
A vida se desfaz
Quando finge nascer
E pensamos viver

E eu que amo sem ter
Sei que vou te encontrar
No platonismo dos meus sonhos
Tal qual ao Cristo redentor

(Nane - 02/12/2013)

domingo, 1 de dezembro de 2013

Calada da noite

Nessa calada da noite
Em  nada se faz bom
O time que se enterra
A cerveja me aquieta

Dopa e entorpece meus sentidos
Apaga as lamúrias escondidas
Solta meu verbo mentiroso
Falo pelos cotovelos

O giro que gira na demência
Entontece e faz balançar
Os passos trôpegos
Trocados numa esquina qualquer

Teor do quê
Do tudo e do nada
Alcool ou cacaína
Embalo de  ilusões

Uma caveira ao meu lado
Se expõe sorrindo
Não sabe escrever
Estala os dedos

Sorriso estridente
Num rosto cadavérico
A brisa da noite
Sopra fria

Faz tua escolha
No balcão do bar
Um chopp gelado
Ainda dá para (pagar) tomar

(Nane - 01/12/2013)



quinta-feira, 28 de novembro de 2013

L'Amour

Decifra-me ou devoro-te
L'amour sou eu
Ouro de tolo
Coisa de bobo

L'amour por mim
E por meu sexo
Que arde e pede
Satisfação

Ninguém é de ninguém
Amar soberbamente
Doença maligna
Câncer da alma

O próprio amor
É o amor próprio
E gozo comigo
Me comendo 

Sou macho e fêmea
Me basto
L'amour sou eu
Me amo

Me transo
De corpo e alma
Sem juízo nenhum
Me dou

Gostosa
Sei que sou
Ainda que para mim
Que provo de mim

Masturbo
Meu corpo 
Meus genes
Meus ideais

L'amour
Imbecilidade congênita
Da raça humana
Que só ama a si mesma

Troco
Meus sentidos tolos
Pela sábia filosofia
Do viver por viver

L'amour
É só uma maneira
De dourar uma pílula
Placebo de vida...

(Nane - 28/11/2013)

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Esfinge

Trevas assolam o dia
Névoas assombram os rochedos
Águas turvas enfeiam o mar
Algas embaraçadas sujam a areia

O marinheiro à deriva
Na "branquidão" velejante
Perde a mão do timão
E o rumo no mar

Por onde andará Iemanjá
A deusa do mar
Em terreiros da Bahia
Em letras de melodias

Que certeza dará
Seu canto de feiticeira
Afogando sem piedade
O tolo apaixonado

Trevas assolam o dia
De quem se deixou levar
Pelas mazelas dos fortes
Pelos prazeres da sorte

Tumba aberta na noite
Aguarda seu triunfo
Corpo esticado no terno
Fina estampa da morte

(Nane - 27/11/2013)

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Sem sentidos


Só o que restou

Dois prazeres na vida me restaram:
o cigarro e a cerveja.
O resto é imposição do destino
- ou de mim mesma, vai saber...

Família é a base (mas não é tudo de bom),
e se a escolhi, não me recordo.
Aceito-a como uma escola
onde é preciso aprender a convivência.

Morreria sem pestanejar
por cada um dos componentes.
Mas não, necessariamente, 
me dão prazer.

A cerveja, essa sim,
me faz sorrir, me encoraja,
me faz chorar, me dita poesias,
me faz cantar, e me dá prazer...

O cigarro, esse sim,
Me alivia, me inspira, 
atiça minha imaginação
enquanto sua fumaça dança -sinuante- no ar

Escrever, deixou de ser prazer.
Virou apenas hábito adquirido
feito o cachimbo que fez a boca torta,
de tanto ser usado.


Dois prazeres na vida me restaram
e ambos fazem parte do meu viver (ainda).
Fumo e bebo sem nenhuma culpa,
e morro pelos prazeres (que restaram).

(Nane - 26/11/2013)



domingo, 24 de novembro de 2013

Leitor ferrado

Cabeça pesada
Cheia de cerveja
Não pensa direito
Ou pensa demais
Visão turva
Coração acelerado
Energético demais
Álcool de menos...

A fumaça fedida
Impregnada nos cabelos
Um, dois, três (ou quase) maços
Paladar perdido
Cabo de guarda chuva
Tempero degustado
Língua plastificada
Beijo artificial...

As merdas das teclas
Se confundem e se misturam
Vistas cansadas
Idade avançada
Rins fudidos
Dores lombares
Cerveja esquentando
Cigarro queimando...

A grana se esvaindo
A cabeça girando
Acho que estou de porre
O livro maldito
Não conta porra nenhuma
Melhor assim
Natimorto escondendo
Meu grande segredo...

Estico as palavras
para dar preguiça
Em quem se atreva
A ler o que escrevo
Ai, que tédio
Só sai porcaria
Se chegou até aqui...
Azar seu

(Nane - 24/11/2013)




quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Embarque

As dores de minha mãe
Me fizaram adoecer
Dói vê-la definhar
Nas dores que a maltratam

As dores de minha mãe
Afetaram nossos  juízos
Ou quem sabe até mesmo
Avivaram-nos

As dores de minha mãe
Revelaram a desconhecida
Que frágil, esperneia
E me olha com desconfiança

As dores de minha mãe
Afastou-a de mim
Embora cada dia mais
Se agarre a mim

As dores de minha mãe
Tornou-me amarga e fria
A ela agressiva
E a nós duas, depressivas

As dores de minha mãe
Estão  matando aos poucos
Toda a alegria e a garra
Que um dia nos uniu

As dores de minha mãe
É só mais uma das provas
Que Deus, na sua "sapiência"
Permitiu que ela passasse

As dores de minha mãe
São regadas de muitas lágrimas
Tanto pelas do corpo
Quanto pelas da alma

As dores de minha mãe
Estão comprando as passagens
Com destinos assegurados
Para o céu e o inferno

(Nane - 21/11/2013)







terça-feira, 19 de novembro de 2013

O inferno

Abrir mão da poesia
Em favor da melancolia
Abrir mão do lúdico
E trocar pelo lúgubre

Os fantasmas que rondam
Nas noites perpétuas
O sol que esfria
A lua que não brilha

A culpa que corrói
A carcaça já apodrecida
A lágrima ácida que fere
A tez enrugada pelo tempo

A menina se matou
O tempo foi cruel
A mulher é sombra
E a vida...morte

Faltou a rima do poeta
Amor e dor não dá mais
Vida e morte são uma só
Quarto e tumba num quadrante

Brilha o sol sem calor
40° sem definição
Suor que escorre no frio
Nada faz sentido

Chama que queima no inferno
Grito que ecoa sem barulho
Dor que dói sem sentir
Vida que acaba sem morrer

(Nane - 19/11/2013)



domingo, 10 de novembro de 2013

Suicídio

Sombras sombrias me abraçam
Teimam em me arrastar
Não quero ir
Esses gritos dispersos
Ferindo meus ouvidos
Me chamam o tempo inteiro
Não quero ir
Mas dizem que eu devo
Um calafrio escaldante
Se apossa de mim
Maldita que sou
Julgada e condenada
Por essa voz que me acompanha
E diz ser minha

Já não sei de mais nada
Nem mesmo sinto
Umbigo por umbigo
O meu não é meu
O lúgubre me reveste
Nos badalos da hora
Que se faz e adianta
Sem mais atrasos
Nas vozes das sombras
Nefastas e hediondas
Que me cercam e me querem
Já quase me arrastam
Sem ligarem para os meus gritos
Eu vou...

(Nane - 10/11/2013)

sábado, 9 de novembro de 2013

E se...

E se o amanhã não vier
Como será o meu amanhecer

E se meus olhos não se abrirem
E se eu não respirar

E se tudo em mim se apagar
E nada mais restar
Para onde eu irei
O que acontecerá

E se você me perder
Será que vai chorar
Um pouquinho, talvez
Mas logo passará

E se nada mais houver
Além dessa malfadada vida
Onde nunca fui feliz
E nunca ninguém me quis

E se o amanhã se acabar
E de mim nada mais restar
Então saiba que vou levar
Você dentro de mim

Para onde quer que eu vá...
(Se é que vou lembrar)

(Nane - 09/11/20132)

Mundão di Deus

Caí nesse mundão di meu Deus
Sem sabê qui rumo tomá
Eu, minina no corpo di mulé
Assanhando a cubiça dus home
Sem sabê que ía mintregar

Um fumo retrucido
O moço bunito bem sabia
Que gostava de fumá
E veio logo cuma talagada
Da danada da cachaça
Que já levou di mim
Um pai e dois irmão

Aceitei o fumo retrucido
Mas bebê...bebo não
Só cerveja que é chic
Mas isso ele num paga não
Num tem dinheiro pra tanto

Aceitei di bom grado o fumo
Moço de barba cerrada
Arranhando meu cangote
Mi fazendo arrepiá
E tremê nu corpo todo
Fizemo saliênça até o sol nacê

Foi assim que eu minina
Nu corpo de mulé
Caí nesse mundão di meu Deus
E pra casamento, dô mais não

(Nane - 09/11/2013)




Mão à palmatória

Quem é você,
Pra me tirar o sono assim,
Quando o que quero é dormir...

Quem é você,
Que grita meu nome o tempo todo,
E no entanto não diz nada...

Quem é você,
Que faz de mim passarela,
Enquanto samba na avenida...

Quem é você,
Que brinca com meus sentimentos,
Fingindo o que não sente...

Quem é você,
Que abre um cerveja gelada,
E derrama por minha goela abaixo...

Quem é você,
Que entorpece meus sentidos,
E some sem deixar rastros...

Quem sou eu,
Que me submeto a isso tudo,
E não tenho vergonha na cara...

(Nane - 09/11/2013)

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Alienação

Dei tanto murro
Em ponta de faca
Idealizei utopias
Acreditei
Nos homens de preto
Comedores da carniça
De seus eleitores

Saí nas ruas
Aos brados de protestos
Derrubando o maioral
E abrindo espaço
Para o próximo da fila
Comer o meu fígado
Sem tempero nenhum

O sangue ferveu
Não é alienação
É mesmo desilusão
Não voto em ninguém 
Nem em Jesus Cristo
Nem em minha mãe
Que nunca me pediram voto

Deixa pra molecada
Essa valente missão
De mudar o mundo
Já não tenho mais forças (nem vontade)
Cansei dessa luta inglória
Mudei a mim mesma
Isso me basta

(Nane - 08/10/2013)

Desassossego

É preciso explicar
O que não sei dizer
Mas sinto o tempo inteiro

Esse desassossego
Que parece consumir
E oprimir
Toda a estrutura
Que ainda resta

Mar em fúria
Dentro de mim
Querendo desaguar
Em tsunami
Bestial

Não é preciso explicar
Isso que sinto o tempo inteiro
Mas não sei dizer

Implode e acalma
Mas não explode
Acorda e aquece
O sangue nascente
Manancial de fúria

(Nane - 07/11/2013)

O inferno é aqui

Vozes agudas
Estridentes gritos
Agonia insistente
Essa falta de ar
Esse cheiro de abutres
Barulhos estranhos
Pedidos de ajuda
Inferno de calor
Suores fétidos
Não sei onde estou

Gente disformes
Em fila indiana
Desembocando na porta
Fechada
Que leva a algum lugar
Onde têm pressa de chegarem
Mas não podem passar
E se digladiam
Arrancando pedaços apodrecidos
Na tentativa vã dessa passagem

O breu desse lugar maldito
Dá descanso aos meus olhos
E evita que eu veja mais a podridão
Nauseante que me cerca
E da qual faço parte
Nauseando os demais
Incomodados com os gritos
Lancinantes em coro
De todos nós

(Nane - 07/11/2013)


Sem reserva

Se hoje
Fechassem meus olhos - de vez
Viajaria sorrindo
E levaria comigo
Para muito além daqui
A doce lembrança
Do amor que vive em mim

Do outro lado
Não sei como seria
Mas lateja a vontade
De saber se eu poderia
Ao menos te olhar
E mesmo (você) não querendo
Zelar por você

Eu
No meu silêncio revelador
Te amo sem reservas
E vou levar por onde eu for
A certeza desse amor
Que se em você, acabou
Em mim, é bem mais que o mundo
E mais um pouquinho...

(Nane - 08/11/2013)

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Macumba

Macumba no mato
Cruzado na encruzilhada
Lá pelas bandas da vendinha
Onde compro sementinhas

Tinha farofa e sangue pisado
Não sei se de frango ou de cabrito
Tava tudo espalhado
Parecia chutado

Ebó todo traçado
Exu, Oxum, Ogum
Oxalá tenha sido um deles
Pois acho que é coisa de cachorro vadio

As velas se apagaram
Molhadas pela chuva
Macumba mal feita
No mato cruzado

Despacho na encruzilhada
Pedi licença e passei
Fui comprar na vendinha
E pra casa voltei aliviada

Saravá

(Nane - 07/11/201)

O pensamento

Chamam-me de louca
Por insistir em amar
Quem já não me quer
E com um sorriso discreto
Desdenhado no canto
Da boca que outrora
Dizia me amar
Me afastou, me repeliu

Mas não posso evitar
A razão me diz acabado
O coração grita saudades
Espalha recordações
Que a mente não consegue apagar
Fazendo à noite, sonhar
Tirando a razão da razão
Colocando em seu lugar
Fantasias e poesias

Não importa o desprezo
Meu amor é eterno
Não importa não se concretizar
Ele é meu e de mais ninguém
E no pensamento
Que também é razão - minha
E também é coração - meu
O orgulho foi trocado
Por esse amor incontestado

(Nane - 07/10/2013)

Artista

Sem falsa modéstia
Sei que sou boa - no que faço
Misturo sentimentos
Gostos e desgostos
Doces e salgados
E até mesmo lágrimas

Faço, nas entrelinhas
Manjares dos deuses
Que apreciam e se fartam
Com a minha arte
Que sei, é tão boa
Diria mesmo, irresistível

E por falar nela
Me despeço da poesia
Vou já para a cozinha
Que meus deuses reclamam
A arte de hoje atrasada
O fogão me aguarda...

(Nane - 07/11/2013)




Frio

A chuva fina infinita por já três dias
Parece querer me derreter a alma
De tanto que lava e leva de mim
Os acúmulos grudentos de dentro

O frio trazido por ela - chuva
Encarcerou-se nela - alma
Fazendo-a tiritante e macambúzia
Tão parecida com a sua morada

Ela - alma - parece não caber
Querer se esparramar
Em busca do sol - calor
Uma outra moradia

Ele - corpo - franzino
Já sem vaidade e nem cuidado
Desagrada seu inquilino
Espírito de tantas moradas

E enquanto cai a chuva
Infinita por três dias
Se contenta somente
Com a leitura de livros

Ela - alma - viçosa
Não gosta da chuva - infinita por três dias
Ele - corpo franzino
Se delicia

Conflito nas cinzas
Sopradas pelo vento
Avivando as brasas
Que essa chuva - infinita - não apaga

(Nane - 07/11/2013)

Disritmia

Foda-se você
Com seu olhar inebriante
Tem a bebida mais poder
De me extasiar
Embora a maldita
Acabe sempre por me lembrar
Da beleza fatal desse olhar

Mas o depois é o depois
E agora você na escala
Está em segundo lugar

Bebo e brindo
Ao esquecer momentâneo
Que entorpece meus sentidos
E me faz esquecer
Dessa sina doentia
Que assassina o meu eu
Implodido e esquecido

Dane-se o amanhã
Viva o agora
Repleto de coragem

Não quero pensar além
Se houver um despertar
Um (re)abrir de olhos
Um acordar
Será mais uma disritmia
Que com toda a certeza
Virará mais uma - depois de outro porre -poesia

(Nane - 07/11/2013)

Sufoco

Um nó na garganta
Não desce
Não sobe
Refluxo
Engasgo
Tusso
Vomito

Lágrima furtiva
Fugitiva
Do côncavo cavado
Na face esculpida
E no barro moldada
Pelas mãos divinas
Do dito Criador

Veemência nos atos
Insanos e descabidos
No grito ecoado
Da alma aflita
Em busca da paz
Perdida na inocência
Da própria verdade

Um nó em desatino
Apertando e matando
No sufoco as vontades
Perdidas em desalentos
Tirando o ar sagrado
Que faz respirar
E viver

(Nane - 07/11/2013)


quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Refrão

Ah quem me dera
Eu tivesse uma viola
E soubesse tocá-la

Comporia uma toada
Bem pequenina
Onde só teria um refrão

"Meu amor foi uma ilusão
Que o mar levou embora
Numa embarcação"

Não tenho uma viola
Nem mesmo um violão
E tocar...não sei não

(Nane - 06/11/2013)



Soberania

Rasga-me as entranhas essa dor lacerante.  
Clamo sem nenhuma vergonha:
Deus! Deus! Meu Deus!
Não ouço resposta nenhuma.
Disseram-me: Peça e te será dado.

Pedi, implorei, clamei,
e no entanto, não me foi dado.
Acaso pedi demais?
Pode ser que sim.
A visão cega é a minha.

Me diz uma voz lá no fundo:
Atemporal o seu pedido
não urge por agora.
Espera que te será dado
quando for chegada a hora.

Sou gaivota solitária
cruzando os mares distantes.
Ele - Deus - soberano,
por vezes estranho
sorri do voo solo que tento alçar

Feito sarça apodrecida por esterco úmidos
cozinho meu cérebro em banho maria
e renovo a tentativa de brotar
na fé desse estranho ser iluminado
a quem denominam Deus

(Nane - 06/11/2013)





Bromoprida

No céu da minha boca
Não brilham estrelas
E as palavras nem sempre
Saem sonoras

A lua não se fez presente
No céu da minha boca
Que vocifera palavrões
Chulos, sem nexos

No céu da minha boca
A acidez predomina
E alguém me manda tomar
Bromoprida

Hoje, do céu da minha boca
Nada mais além do que a fumaça do cigarro
E o gelado
Da cerveja

Repasto de poesias
No céu da minha boca -hoje-
Restou o azedume do vômito
Contido pela bromoprida

(Nane - 06/11/2013)

domingo, 3 de novembro de 2013

Pensando

Encho meus pulmões enegrecidos
Com a fumaça do cigarro
Amigo que me abraça
Seu abraço fatal

Certo que me matará
Mas meu prazer é matá-lo
Trinta ou quarenta vezes ao dia
Me ajuda a pensar...

Idiota viciada
Não luto contra o vício
Ao contrário, gosto dele
Faz parte de mim

Temo só a covardia
De uma morte dolorida
Mas a morte em si própria
Essa não me assusta

A certeza que me resta
É a de morrer um dia
Então que seja fumando
E tomando uma cerveja

(Nane 03/11/2013)


Gaiola

Pássaro preso
Tratado e alimentado
Cantando seu canto
Por tantos admirados

Sina enfadonha
De passos contados
Pela gaiola dourada
Seu habitat

Só o verbo cantar
Sabe conjugar
Viver, amar, procriar
Desconhece o que seja

O tempo é claridade e escuridão
Não se conta mais nada
Dia, semana e ano
É o claro e o escuro

Já nem sente pesar
Ou mesmo alegria
Vive o que é permitido
Na prisão da sua vida

Liberdade é desconhecida
Felicidade nunca teve
A morte não teme
Talvez por querê-la

Pássaro preso
Tratado e alimentado...

(Nane - 03/11/2013)

Objetiva

Um dia me disseram
que eu tinha "pena" de mim.
Parei para pensar
e vi que estavam certo.
Decidi mudar e mudei.
Já não me sinto coitadinha,
e pena, nem de mim ou de ninguém,
eu sinto mais.
As vezes assusto
com a minha própria frieza.
Já não choro pelos cantos,
e não me comovo com quem chora.
Meus sentidos se racionalizaram
e hoje sentem o que devem sentir.
A vida é uma escola
onde você precisa aprender
que viver é seguir em frente.
Se parar, por certo vai morrer.
Joguem as pedras que jogarem,
agora estou de carapaça,
não vai me atingir.
Venha o vento que vier,

me preparei para encarar,
A vida me fez assim
e é assim que eu sou.

(Nane - 03/11/2013)

sábado, 2 de novembro de 2013

Finados

O dia é dos mortos
E eles ganham flores
Sentem-se nauseabundeados
Com o cheiro do próprio enterro
Relembrado pelos seus

A corrente dos sentimentos
Os arrastam aos cemitérios
A contragosto
Mas vão assim mesmo
Por amor aos vivos

Quando foi a última vez
Que uma flor foi te ofertada

Não se desespere
O seu dia vai chegar
E então, todo ano
No dia de finados
Você vai ganhar

O dia é dos mortos
Que mais do que nunca
Vivem
Enquanto os vivos
Aos poucos...morrem

(Nane - 02/10/2013)

Bipolar

Tal qual um relâmpago
Vou de um extremo ao outro
Vento sem rumo
Direção à deriva
Nau fantasmagórica
Perdida num mar
De espumas e areia
Que acaricia e fere
Sem se importar

Bipolar insana
Vago por dois meios
Sem compreender 
A hora de parar
Mudar a direção
Deixar em paz
Ficar em paz
Saber o que é paz
Me acalmar

Dois polos diversos
Positivo e negativo
Contra e a favor
Preto no branco
Loucura sã
Da insana perfeição
Na busca dúbia
Do ser que sou
Perdido em dúvidas
De ser só eu

(Nane - 02/10/2013)

Serenidade

Cérebro e coração.
Vísceras corroídas por sentimentos
conflitantes.
A dor da culpa machuca
pensamentos racionais -num quase nazismo-
que impele à libertação
da matriz sofrida
pelas dores físicas.

O coração dói ao imaginar
a sensação de vazio,
sem saber se é egoísmo
ou o amor natural de gerações
que clama pela longevidade
do ser primaz tão amado
que já reclama do peso de sua cruz.

Faça-se a sua vontade
Criador das criaturas.
Só nos dê serenidade para
tentar entender e aceitar.

(Nane - 02/10/2013)



sexta-feira, 1 de novembro de 2013

O Pastor


Hoje,
sem muito o que fazer,
parei para pensar:
Em outros tempos
estaria, com certeza,
na boemia da Lapa,
ou em Vila Isabel,
quem sabe em Madureira?

Santa não sou,
o que me falta é a "ocasião",
mas ainda assim, parei para pensar:
Porque não posso?
É sexta feira!
A mulher ao meu lado,
sentada e olhando para a televisão
sem entender nada do que assiste
(mas que não se ouse mudar de canal),
é a mesma que a tempos atras
me ensinou a escrever.
Ah...essa tal liberdade!
Hoje sei que o preço a pagar
não cabe no meu bolso,
e tão pouco na minha retidão.
O "Cara" lá de cima está comigo
e eu com ele.
Sou sim rebelde, e peco
por meus excessos.
Mas volto à minha sanidade
quando olho naqueles olhos,
que de verde não tem mais nada
além de cataratas descoradas.
Eu passo e ele -o tempo - não.
Resta-me deitar nos verdes pastos
e aguardar mansamente que ele 
me guie.

(Nane - 01/11/2013)

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Um gole de cerveja

Tô com vontade de chorar
Não sei se por mim
Por ti
Ou se por tudo

Engulo o choro
Mas não evito
Que a lágrima escorra
Pela face 

Nem tão pouco
A agonia sentida
No nó engasgado
Na garganta

Um gole de cerveja
Ajuda a desatar
Refresca a cabeça
E finjo não chorar

(Nane - 31/10/2013)

Horizonte perdido

Quando estava prestes a encontrá-lo
Tocá-lo...ali, tão próximo de mim
Bastava um passo - Só um...
Um vendaval tão forte soprou
Me derrubou
Uma nuvem negra me envolveu
Cobriu meus olhos de poeira
E meu horizonte se perdeu

E o tempo...
Esse cavaleiro implacável
Zombou de mim dizendo
Que eu estou passando - por ele
E perdendo forças no caminho
Em busca do impossível
Que - sabemos - não é para mim

Voltei à visão
Só vi a linha - tão distante
O mar revolto
Uma lágrima sorrateira
O gosto do sal
O sol a pino
E o horizonte - outra vez - perdido

(Nane - 31/10/2013)

Brisa de Deus

Soprou Deus uma brisa no nordeste
Em direção à Fortaleza
E estava ele de bom humor
Quando essa brisa moldou
E deu a ela o nome
De Fátima, só Fatinha

Seu riso escancarado
É marca registrada
Luz irradiando o bom humor
Do supremo Criador
Em forma de gente (muito gente)
Que Ele aqui nos ofertou

Cinquenta é muito pouco
Viverás eternamente
No sorriso de todos nós
Pois que és sinônimo de alegria
E é para você a minha poesia
Amiga minha

*Parabéns!!!

(Nane - 31/10/2013)

Revoada

Dá um tempo para mim
Já não tenho mais nada
Arrancastes de mim todas as vísceras
O legista se surpreenderia
Na necropsia em vida
Sem anestesia

Autômato programado
Sem nenhum espaço na mente
Além da sua imagem
Dilacerando o cérebro em podridão
Feito pilão esmagador
Socando, socando, socando

Em encosto de macumba
Me transformei
Exu veio me abraçar
Com pena de mim
Mas sorriu seu riso debochado
Numa rodada de marafa

Dá um tempo para mim
Me livra dessa encruzilhada
A carcaça tá muito machucada
Não presta nem para a urubuzada
Que sem as entranhas
Preferem a revoada

(Nane - 31/10/2013)



Retrato

Se me dado fosse dado o dom 
De retratar em uma tela
Os traços de quem amo
Detalhe nenhum me escaparia

Saberia com precisão
Interpretar cada um dos seus sentidos

O seu olhar melancólico e insinuante
Que parece me atravessar e desnudar
Dizendo tanto o que nunca falou
A boca que primazia o silêncio

Eu pintaria a sua aura
Como mais ninguém a vê

E seu jeito um tanto quanto só seu
Retrataria feito pássaro em voo
Sem amarras ou arapucas
Sem nada te prender

Embora eu sempre tenha armado
O alçapão inerte e inútil

Seu mistério eu não pintaria
Por nunca ter compreendido
E por ser o único responsável
Por eu ter te perdido

Pintor não sou, e nunca serei
Então rabisco com palavras...você

(Nane - 31/10/2013)


quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Disfarce

Faz do teu silêncio punhal
Sabendo bem do estrago
Se te compraz

Meu corpo não morrerá
A dor vem de dentro
A alma é quem chora

Sorrio meu disfarce
Deságuo e desabo
Em meu refúgio

Passo meu tempo 
Vivo minha vida
Sigo empurrada

A alma escura
Não contamina o corpo
Que sabe disfarçar

Mas na solidão da noite
Me deixo morrer
Querendo não voltar

(Nane - 30/10/2013)

Elke

Essa leveza em teu olhar
Me fez pensar num acróstico
Onde eu falaria da singeleza
Que sinto no seu rabiscar
Mas eis que a letra K
Se interpôs em meus propósitos
E não deu para criar...

Ah mulher 
Brinca com as palavras
Como menina com as bonecas
E elas saem tão suaves de tua alma
Que nos é possível ouví-las
Sob forma de poesias
Tal qual a sua imagem
Sempre bela e delicada

Se não te fiz um acróstico
Foi só por incompetência
Mas foi melhor assim
Posto que seria bem pequeno
E eu não poderia te dizer
Que gosto de você (Elke)

(Nane - 30/10/2013)



Brisa

E te fostes de mim
Como a brisa que vem  do mar
Mansamente
Sem mais voltar

E deixastes em mim
O frescor fugaz
E no entanto perpétuo
Do teu olhar

E levastes de mim
O melhor que te pude dar
Que sei, vais guardar
E lembrar

E agora restou o mar
Passou a brisa
Outra virá, por certo
Mas o brilho daquele olhar...

(Nane - 30/10/2013)

terça-feira, 29 de outubro de 2013

(Re)Começo

Essa saudade absurda
Dizem ser vontade
De um outro começar
Mas não é...
Não dá pra começar
O que já terminou
E esse...não dá para apagar

Se terminou
É por ter havido
Existido

Essa saudade absurda
Na realidade é a vontade
De que nunca tivesse acabado
E eu nunca precisado
Do prefixo Re
Para dar sequência
Na nossa história

(Nane - 29/10/2013)

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Alienada

Enquanto caramujo
Eu não saía pelo mundo
Vivia pelos arredores
Sem me queimar ao sol

Enquanto avestruz
Minha cabeça era vazia
Não haviam problemas
No buraco enfiado

Enquanto criança
Acreditei que era verdade
Que o mundo era meu
E olha no que deu

Enquanto alienada
Eu fui feliz sem saber
Que do meu mundo seria alijada
Já não quero mais nada

Enquanto espero a morte
Finjo que vou vivendo
E feito uma gaivota
Deixo meu sonho voar - sem pousar

(Nane - 28/10/2013)

Sofismo

Tentei lograr
Sem me fazer de rogado
Fui, sem nunca ter sido
Dei o que não tinha
Perdi o que eu era

De mim restou apenas as vísceras
Expostas aos corvos

Uma dor contínua
Mantém no limbo a vida
Para que não cesse nunca - da minha mente
Os sofismos que usei
Quando não raciocinei

Sou presença malquista
Em lembranças fragmentadas

A massa sangrenta se dilacera
Débil, tênue e dolorida
O psique prisioneiro em amarras
Vendo e vivendo o desespero
De não poder se desvencilhar

Não tem reza e nem santo que dê jeito
A agonia é fato

(Nane - 28/10/2013)


domingo, 27 de outubro de 2013

Linhas tortas

Testa-me Deus a todo instante
Faz de mim sparring da fé
Por vezes me leva a nocaute
E perco a noção de mim

O Deus poeta
De tanta beleza
É o Deus de linhas tortas
Que escreve certo

Suas obras magníficas
Cheias de harmonias
Mexe e remexe
Me vira do avesso

De tanto apanhar
Eu xingo e esbravejo
Mando-o à merda
E torno a levantar

Pergunto autoritária
O motivo da escolha
De tantos desatinos
Mas ele não responde

As vezes me sorri
E finge uma braveza
Quando bate mais doído
Na altura do meu fígado

Testa-me a todo instante
Parece me querer ferir
Mais e mais e mais
O Deus supremo dos meus dias

Não sei quanto tempo ainda
Mas vou continuar lutando
E enquanto ele achar que deve
Vou apanhando

(Nane - 27/10/2013)











sábado, 26 de outubro de 2013

O pivete

Era só um menino (no alto dos seus nove ou dez anos) encostado na placa de publicidade de um ponto de ônibus da grande metrópole. Ele guardava sob a blusa suja e resgada as duas mãos, como que as protegendo do frio, ou as escondendo. A maioria das pessoas que aguardavam o transporte, o observava furtivamente, com medo do olho no olho (inclusive eu). Ele também nos olhava de soslaio, como se soubesse que havia um medo no ar. Acendi um cigarro, até para ter o que fazer com minhas mãos, e tentar esquecê-lo. Mas foi exatamente isso a "deixa" para que ele se aproximasse e dissesse: _Tia, me dá um cigarro? 
Numa fração de segundos minha mente processou inúmeros pensamentos: 
- se eu não der ele tira a arma escondida dentro da blusa e me mata.
- Se eu der, vou me sentir idiota por alimentar o vício de uma criança.
- E se meu filho, que é bem mais velho do que ele, me pedisse um cigarro?

- Se ele me mata, quem vai acabar de criar meu filho?
- Se eu morrer, vou querer uma festa em meu velório.
- Droga, nem disse adeus a ninguém.
- Quem irá ao meu enterro?

Eram pensamentos assim, sem nenhum sentido ou nexo, movidos pelo medo e a perplexidade de ter sido a "eleita" entre tantos ali presentes. Respondi num ímpeto que nem eu mesma sabia ser dona : 
_Você é filho do meu irmão? 
 _Não. 
_E da minha irmã?
Ele me olhou de cima em baixo, tirou as mãos de dentro da blusa ( nesse instante eu intimamente me despedi da vida ), e tranquilamente sorriu e respondeu:
_Tia, eu só quero um cigarro, daí vai... 
_Não sou sua tia. Eu disse, sentindo um grande alívio por ver que as mãos dele estavam só sendo protegidas do frio.
_ Tá, então me dá um cigarro, moça?
_ Não posso, é contra os meus princípios.
_ Seus o que???
_ Filho, não posso te dar um cigarro porque....
Antes que eu terminasse ele me interrompeu e perguntou :

_ Moça, a senhora já transou com o meu pai?
Eu atônita e furiosa, respondi quase gritando ( nessa altura já não havia medo nenhum em mim, só a indignação com aquele pivete ) :
_Tá maluco moleque? Não tem vergonha na cara? Isso lá é pergunta que se faça?

Ele se aproveitou da minha distração, deu um tapa na mão em que eu segurava o cigarro aceso, pegou-o no chão e antes de correr por entre a multidão gritou bem alto :
_ Então não me chame de filho, moça.


(Nane - 26/10/2013) 

Dúvidas

Toda a eternidade num só momento
Intenso
Um só momento
Eterno
E o tempo sem tempo nenhum
Escasso
Se esvai
E vai
Na imensidão do infinito
A solidão
Acompanhada de pessoas
Solitárias
Pondo em dúvida
A imortalidade
Comparada a felicidade
De um só momento
Eterno

(Nane - 26/10/2013)

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Duplo sentido

Hoje ela aniversaria
Sorrimos, comemos, bebemos
Comemoramos
E muito
Hoje ela venceu mais um ano
Outra etapa se inicia
E ela
Sem negar os genes
Da mãe guerreira
Mais do que nunca
Se mostra forte e disposta
A encarar e derrotar
A doença "maldita"
Hoje
Ela é fortaleza
Pronta a encarar
O que vier pela frente
De mãos dadas com Deus
Hoje
Mais do que nunca
Minha irmã se renova
Na fé e na esperança
De um presente Divino
Para dizimar a doença
Que se feroz
Com ela não pode

*Parabéns (duplo sentido) Guerreira!!!

(Nane - 25/10/2013)


Fruto vermelho

Hoje comi o meu tomate
Tinha um gosto proibido
Ainda verdolengo
Ácido e gostoso

Estava duro 
Com manchas em seu corpo
Mas tão gostoso...

Saboreei cada pedacinho
Como se nunca mais o pudesse comer 
(E não vou comer mais. Não aquele)

Lambi cada um dos meus dedos
Impregnados do seu sumo
Do seu suco
Da minha vontade...

Fruto vermelho
Pecado e desejo
Macio e consistente
Delícia corroendo a minha mente

O azeite que se dane
Voltei na infância
Azeite seu, não meu
Comi o tomate
E ele me comeu...

(Nane - 25/10/2013)


quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Algoz

Eis que me entrego sem entrega alguma
Busco tirar de mim, teu fantasma
Em outros corpos, que não o teu
Mas quando do ato, escorre sobre minha pele
O suor que misturou ao teu 
E por isso escorre teu cheiro

Pobre do tolo que me toma
É mero autômato do gozo
Ou eu, mero objeto de alívio
Ele usa, pensa que abusa
Sorri sem jeito, satisfeito, suado e sai

Não gosto do seu gosto
E nem do seu cheiro 
Só queria espantar teu fantasma
Que se recusa a partir
Me assombrando e castigando
Cada vez que tento te esquecer

Sou mera meretriz
Trocando de valores
Oferecendo meu corpo
Para quem se arriscar
A te matar em mim

(Nane - 24/10/2013)

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Fragmentos

São lembranças tão vivas
Mas um tanto embaralhadas
Ela fala de alguém que conheceu
E que não é quem (ela) diz ser

Seu olhar um tanto vago
Vagueia num passado confuso
Se perde num presente efêmero
Quem é, quem foi, quem será

A fragilidade no corpo arqueado
Esconde a força do espírito
De guerreira persistente
Caducando, mas altiva

Ainda encontra humor
Para brincar com os netos
Que teima serem crianças
Filhos de seus filhos

Mistura seus momentos
De total lucidez
Com o esquecimento das feições
Da própria genealogia

Vence mais um dia
De dores e melancolias
Sequer sabe que se fez musa
Da filha que a faz virar poesia

(Nane - 22/10/2013)

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Ego de poeta

Poeta teu ego o martiriza
Escreves teus dissabores
Vives teus poemas
Teus poemas são você

Necessitas que te leiam
Mas não gostas da leitura
Que por vezes te fazem
E te sentes invadido

Poeta criança
Tu pensas que o mundo
Foi feito para ti
E só de ti, vive

Te sentes prestigiado
Ao lerem teus sentidos
Mas a outros poucos poetas
Prestigias com a leitura

Criança pirracenta
Só teu mundo importa
Cuidado com teu ego
Há sentido em outros mundos

Há poesias em palavras
Escritas por outros tantos
Que tão crianças como tu
Dividem o mundo e não somam

(Nane - 21/10/2013)











sábado, 19 de outubro de 2013

Convívio

A coluna já me manda aviso
De que anda cansada
Mas a dela...virou um "S"
E precisar ser amparada

Não sustenta mais o corpo
Octogenário, sozinha

O verbo conjugado machuca
E o ouvido se faz de surdo
Ambas as partes se desgastam
Em cargas nos espíritos acumuladas

Eu tento e ela tenta
Difícil convivência

E a memória, antes tão esplêndida
Agora se deteriora mais e mais
Causando um misto de pena e revolta
Por ver ela aos poucos ir embora

Suas dores são tantas
Minhas dores são poucas

Cifose,  lordose, escoliose
Dores do corpo gerando
Dores nas almas conturbadas
Pelas dores misturadas

(Nane - 19/10/2013)



sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Terapia


A chuva caiu mansa
E o mato brotou com força
Enchendo os canteiros
Sufocando as verduras

Eu, que me sentia solitária
Arregacei as mangas
E encarei
As ervas daninhas

E divaguei...

Que solidão que nada
Me fez companhia a passarada
Procurando pousada
No entardecer

A minhoquinha desesperada
Fugindo do fio da enxada
Deixei ir em paz
Pensando no bem que ela faz

Falei com meus tomates
Ainda esverdeados
Quase prontos para a colheita
Indo de encontro ao alface

Nesse instante meu menino
É o pequeno jilozinho
Que por enquanto é só flor
Embalado por meu canto

Conversei com as ervilhas
Cobri de terra os pés de milho
Me arranhei no quiabeiro
Colhi o que plantei

O chuchu tão verdinho
Se esparramando pela cerca
Misturado com a vagem
Parecem seguir viagem

E em meio a tantas coisas
Nem percebo que o tempo passa
Esqueci que estava sozinha
Acabei com a erva daninha

(Nane - 18/10/2013)