sábado, 8 de março de 2014

Happy hour

Ela olhou por olhar
pelas frestas dos edifícios
da avenida central
e viu, quase sem querer
aquele menino sujo e remelento
escondido por detrás dos latões de lixo
do restaurante de luxo.
Garimpava seu "ouro" comestível
e se assustou quando cruzou olhares com ela.
Mulher bonita e fina, cheirosa e misteriosa.
O que faria com ele, era só o que passava
na cabeça imunda e cheia de piolhos.
Pensou em correr, mas estava encurralado
nos fundos dos edifícios, e sua única saída
passava por ela...a mulher. Que falta de sorte
justo quando encontrou comida para tirar
a barriga da miséria, ela apareceu assim do nada.
Foram segundos que duraram uma eternidade
antes que pudesse ter uma ideia do que fazer:
correr, empurrá-la, gritar, chorar, implorar...
fechou os olhos, tornou a abri-los e ela continuava
ali, olhando nos seus olhos.

Droga, tinha tantas outras ruas por onde passar
que sairiam no mesmo lugar, porque fui entrar
justo aqui. Era só no que ela conseguia pensar.
E se ele resolve tirar uma faca da sacola suja e me
furar toda? Provavelmente está sob o efeito do crack
ou da cola, sei lá. Ela só conseguia olhar fixamente
para aqueles olhos frios na tentativa de adivinhar
os próximos atos. Pensava em como sair da situação
que idiotamente havia se colocado ao ceder a curiosidade
de olhar por aquelas frestas malditas.
Por certo ele iria querer seu dinheiro, suas joias, seus
celulares...o tablet com tantas informações profissionais.
Poderia recuar de mansinho, mas os olhos dele meio que
diziam a ela para não o fazer, pois iria atrás e certamente a
alcançaria.

Um relâmpago riscou o céu da cidade num estrondo ensurdecedor
e uma torrente de águas desabou numa só pancada.
Gente correndo pra todo lado, fugindo da chuva. Um menino assustado,
uma mulher aflita, mas aliviada...outro dia terminado na cidade grande.

(Nane - 08/03/2014)

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